terça-feira, 19 de maio de 2015

Acordo no meio da noite

Acordo no meio da noite aos prantos
As lágrimas insistem em quebrar a dureza da realidade
De um sonho breve que se mostrou só sonho

Acordo no meio da noite aos prantos
Como criança impotente diante do pesadelo
Mas sem a proteção de quem zela por ela

Acordo no meio da noite aos prantos
E a noite se revela como é de fato:
Solitária, obscura e reveladora

Acordo no meio da noite aos prantos
O cobertor já não aquece, a brisa já não resfria
É o desconforto da falta de conforto

Acordo no meio da noite aos prantos
Na esperança de abrigo lá fora
Pois esqueci como proteger aqui dentro

Acordo no meio da noite aos prantos
Lágrimas para embaçar uma verdade
Empacotada de belas e tentadoras mentiras

Acordo no meio da noite aos prantos
Ferida aberta
Corpo fechado

segunda-feira, 9 de março de 2015

Verbalizando verbos

Cai a noite
Cai a chuva
E cai a ficha:
Estou caído por você

Salto, a cidade
Salto, o deslocamento
E então o sobressalto:
Estou em queda livre

Fodeu a razão
Fodeu a armadura
E o mais foda de tudo:
A foda ainda está por vir

Penso logo existo
Penso logo sou um
E então o pensamento:
Estou só a pensar em dois

Sinto a presença
Sinto a distância
E então vem sentimento:
Quero estar com você.

(Dedicado a uma história e compartilhado com alguém real)

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Teia

Você, teia, me hipotiza!
Suas linhas...
Me embaraçam!
Suas tramas...
Me vitimizam!
Seus nós...
Me atam!
Seus laços...
Me desembrulham!

Você, teia, me entrelaça!
Sua força...
Me segura!
Sua construção...
Me demole!
Sua complexidade...
Me reduz a 1+1!
Seus fios...
Me conduzem!

Você, teia, me enrola!
Meu sexo...
Você devora!
Minha razão...
Você instiga!
Meu eu...
Você não sei!
Minha loucura...
Você endossa!

Você, teia, não me prende!

sábado, 7 de abril de 2012

A melhor frase do dia

Como você pode falar de “amor” pra mim se nem o controle do meu portão você tem? Essa coisa (o amor) não está nas palavras, ela germina dos pequenos atos.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Soltas

Tenho uma predileção secreta pelas chuvas de verão. Elas parecem muito com brigas de casal apaixonado:

Chegam intensas, devastadoras apenas para amenizar o calor. Depois tudo volta de volta.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Randômico #1

Quem dera eu fosse um curativo espiritual para estancar esse corpo fechado de alma exposta.
Quiçá ser um passatempo eterno para brincar de verdades sérias com seu coração.
Ser um lunático de pés fincados em solo marciano. Ser Marciano, Márcio, Mário, Maria, ser Plutão.
Escrever um livro de cem páginas, sem páginas, mil tons e alguns bits.
Achar na língua inglesa compulsória meu português anárquico.
Encontrar noutra língua minha boca.

Quem dera eu ter um novelo de linhas aéreas para trançar em nós bordados alados.
Quiça ser caótico o suficiente para botar sua vida em ordem com a minha.
Ser um achado, um perdido, um pedido, um machado, um manchado, um fodido.
Fazer alusões a ilusões irreais na busca da real desilusão que um dia jamais viverei.
Jogar palavras e escrever jogos. Ganhar palavras, perder jogos.

Quem dera eu redigir uma sentença perpétua de liberdade presa a predicados, sujeitos e a objetos diretos e não identificáveis.
Quiça ter amor próprio o bastante para aliená-lo, consigná-lo, financiá-lo, fazer leasing. No final das contas, receberia de juros mais amor.

Quem dera eu você tivesse gasto seu tempo lendo algo tão mais originalmente medíocre que isto que aqui acaba. Ou recomeça?

domingo, 29 de maio de 2011

Psiu aí, nós estamos gritando aqui.

Às vezes há tanto barulho aqui dentro que mal ouço aí fora.
São mil Miltons em pleno uso de suas cordas vocais.
Alguns falam, outros gritam; os mais apaixonantes sussurram.

Eu sou o único que se cala.

São mil tons de vozes em diferentes tempos de um mesmo tempo.


Sou eu na voz passiva, imperativa, ativa, rouca e quase afônica.
Cada uma com seu tom, seu timbre, seu desejo; todas em mim.
Meus mil tons barulhentos que fazem de mim um insano em silêncio.
Mil tons que dizem: Milton sem tom, sem voz, e muito louco.
Todos em uníssono.

Eu ligo o som, a TV, a internet. Ligo o desespero para calar as vozes.
Vozes, que vozes? – pergunta a voz hipócrita.

Mate todas, diz a mais imediatista.

Ao menos você tem cia. – a fofa (ou carente?) se manifesta.
Tudo isso é a manifestação de um Milton reprimido – analisa a mais insana.
E eu já não sei qual delas é a minha.

Às vezes é tanto silêncio aí fora que ensurdeço com o barulho aqui dentro.
Então, psiu aí! Nós estamos gritando aqui... dentro deste Milton calado.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Quase

Quase desencontro. Foi assim que tudo começou.
Quase nada que mutou para quase tudo.
Eu era um quase desconhecido.
Quase colega.
Quase amigo.
Quase amante.
Nós... quase amantes.
Quase.
Quase olhares.
Quase um beijo.
Quase físico.
Quase não platônico.
Quase.

Quase nunca palavra.
Quase sempre gestos.
Quase homeopático.
Quase lisérgico.
Quase loucura.
Quase cura.
Quase você fica.
Quase a gente fica.
Quase eu e você.
Quase encontro. Foi assim que tudo terminou.
Quase.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Meu presente: MUITO OBRIGADO

Independente de credo, tradição ou consumismo, eu resolvi instituir 25/12 como o dia de dizer MUITO OBRIGADO!

MUITO OBRIGADO à família que me acolhe com seus valores sólidos e atitudes deliciosamente malucas; olho para vocês e vejo pessoas imperfeitamente lindas, eu me vejo em vocês.

MUITO OBRIGADO aos amigos que riram, brincaram, brigaram, divagaram, choraram e cresceram comigo ao longo do ano.

MUITO OBRIGADO a você que fez meu coração bater descompassado, que trouxe alegrias, prazeres e algumas lágrimas; cada vez mais me reconheço de carne, osso e alma.

MUITO OBRIGADO aos que me ignoraram ou simplesmente tentaram me prejudicar de alguma forma. Sou mais humilde e generoso por causa de vocês.

MUITO OBRIGADO às coisas e pessoas (boas ou ruins) que fazem eu ser o que sou hoje, a ter o que tenho hoje. E o que tenho hoje, agora é só... GRATIDÃO.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

"Bang Bang Bang"

Fogão pra que mesmo?

Depois de quase 6 anos morando sozinho (com algumas companhias temporárias, na verdade), muita pressão e meses de negociação resolvi comprar um fogão.

Sinceramente, eu não entendo a indignação de algumas pessoas ao saberem que eu ainda não tinha esse tal utensílio doméstico.

Ei, pra que existe microondas? E o forno elétrico então? Quem convencionou que fogão é item obrigatório para quem não quer passar fome?

OK, depois de anos à margem eu resolvi ceder. Acho que não foi pela pressão social (ou culinária?), acho...

Apesar de não ser meu, ele (o fogão) já estava lá no espaço que lhe é dedicado e sem a atenção do ex-dono. Fiz uma oferta de compra que só foi aceita 4 meses depois.

E agora, o que muda?

Finalmente vou acompanhar o programa da Palmirinha? Ah tá, ela se aposentou, não vai rolar.

Hummm, agora eu vou gravar as receitas da Ana Maria Braga. Acho que não, faz (não fazem, Vitor) anos que não tenho vídeo cassete.

Quem sabe então eu tente uma das receitas do Jamie Oliver. Lembrei que os ingredientes que ele usa são difíceis de serem encontrados (sem falar no preço) aqui no Brasil.

Aí minha mãe solta a seguinte frase: “Filho, você deu mais um passo para o casamento.”

Tá bom, vou olhar para aquela caixa metálica que cospe fogo e dizer: você é apenas um fogão.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Eu reclamo, você reclama, nós reclamamos

Ultimamente eu tenho estado irritado. Mais do que irritado, ando puto da vida, indignado e reclamando de alguns comportamentos que não consigo entender no outro e, claro, em mim também.

Tem sido comum, muito constante mesmo, pessoas ao meu redor queixando-se (e muito!) de tudo e de todos. As mazelas vão das mais pertinentes às mais insignificantes. É como se houvesse um vácuo tamanho nelas (ou em nós?) que a mais densa matéria seria incapaz de preencher o vazio.

A vida se resume a demais e de menos. O trânsito é demais e as alternativas de menos. O ar condicionado é de menos para calor demais; o inverso também vale. O sexo demais para diálogo de menos. O diálogo demais para sexo de menos. Românticos de menos para sacanas demais. Lunáticos demais para terapeutas de menos. Soluções de menos e reclamações demais.

E eu, na minha piração de análise de botequim, tento contextualizar e compreender tanta insatisfação. De onde vem a falta de tanto e a satisfação de menos? E noto um padrão até contraditório (nada fundamentado, apenas empírico) nos “reclamações”: no geral são pessoas que não tiveram grandes privações na vida.

São aqueles que têm carro do ano, trafegam sozinhos pela cidade e reclamam do trânsito. Aqueles que jantam fora três vezes na semana e criticam o governo por ceder o Bolsa Família. Aqueles que ignoram a copeira da empresa e pregam o respeito como religião... só quando se aplica a eles.

Na falta de problemas reais, as chatices banais viram grandes aborrecimentos. Na falta de responsabilidade dos próprios atos, culpamos o outro, seja ele quem for. Em resumo, vivemos em tempos de “umbigocentrismo”.

Hoje, por exemplo, enquanto almoçava com algumas amigas para comemorar boas notícias e, claro, reclamar do tamanho do prato e do frio que fazia, vi passar um morador de rua que não fugia da chuva intensa e gelada.

Naquele instante, ele sim tinha bons motivos para se queixar da sua sub-vida, das privações e do poder de ser invísivel. Estava aparentemente sereno, talvez resignado com o fato de que estava ali para se molhar, literalmente. E eu? Eu estava seco, aquecido e comendo um belo pedaço de picanha...

Preciso dizer algo mais?

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Como saber se sua história de amor é um potencial "bad romance"

São 5h30 da manhã e sobram vocês dois na balada. Ela/ele chega até você e diz: “Você é a pessoa mais bonita desse lugar”.

É o segundo encontro e ele/ela diz que muda de ideia com um certa frequência e você nem dá bola.

Conheceu alguém que acabou de sair de um relacionamento conturbado e você jura ser capaz de mostrar o quanto ele/ela pode ser feliz de novo ao lado de alguém.

Na primeira oportunidade que estão sozinhos você fala sobre seu passado, seus traumas de infância, sua adolescência conturbada e o quanto o Zyprexa e o terapeuta mudaram sua vida.

Você pede salada de alface no primeiro jantar juntos e resolve jogar charme com seu melhor atributo: o sorriso.

Conheceu alguém acima dos 30 anos, inteligente, bom emprego, beija bem... e ainda mora com os pais.

Está rolando um “papo” há horas, você mostra que tem opinião formada sobre política, sociedade, ecologia, astrofísica e ele/ela só no “Ahã”, “Eu condordo”, “Eu também”.

Toda vez que vocês estão juntos o celular dele/dela está desligado.

Ele/ela demonstra interesse em levar uma história mais séria contigo apesar do pouco tempo juntos e você pergunta qual foi a duração média os relacionamentos anteriores dele/dela. A resposta é “algo em torno de 2 meses”.

Tem dois dias que vocês se conheceram e sua família, amigos, colegas de trabalhos já sabem de todos os detalhes do casal.

Você diz “eu te amo” na primeira vez em que foram pra cama.

sábado, 31 de julho de 2010

Entre aspas #8

Passamos a vida nos comportando como um touro numa loja de porcelana chinesa. Partimos algo aqui, quebramos outra coisa ali. Estamos sempre machucando a nós mesmos e a outras pessoas.

O problema é descobrir como controlar o dano que causamos; ou pior, o estrago causado por outra pessoa. Às vezes somos pegos de surpresa. Às vezes achamos que podemos dar conta do estrago. Às vezes, não damos conta de que existe um dano.

Olhando fundo na ferida, todos somos traumatizados. Alguns mais que os outros. Carregamos alguns traumas desde a infância e, depois, como adultos, nós descontamos o que sofremos.

No fim das contas, nós causamos os traumas e, se temos um pouco de consciência dos nossos atos e somos crescidos o suficiente, tentamos reparar o que ainda é possível... em nós e no outro.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

"Keep The Lights On"

Entre aspas #7

Após cuidadosa reflexão e muitas noites sem dormir, eis o que decidi: adultos não existem. Seguimos em frente, partimos para o mundo, deixamos nossas famílias e criamos a nossa própria, quando conseguimos. Mas as inseguranças básicas, os medos primários e todas aquelas velhas feridas crescem junto com a gente.

E justo quando achamos que a vida e as circunstâncias nos forçaram a finalmente e realmente virarmos adultos... Seus pais começam a agir como crianças.

Ficamos maiores, mais altos, mais velhos. Mas, na maior parte do tempo, ainda somos um bando de infantes correndo pelo playground, tentando desesperadamente se enturmar.

Ouvi dizer que é possível virar adulto, só nunca encontrei alguém que o tenha feito. Sem pais para desafiar, quebramos as regras que criamos para nós mesmos. Temos ataques quando as coisas não acontecem como queremos.

Sussurramos segredos para nossos melhores amigos no escuro. Procuramos apoio onde podemos, nem que seja na mesa de um bar.

E nós torcemos contra toda a lógica, contra toda a experiência. Como crianças, nunca abandonamos a esperança.

domingo, 27 de junho de 2010

Carta aberta

Durante algum tempo seu nome foi para mim sinônimo de competição. Bastava pensar nele ou ouvi-lo que meus punhos cerravam, a alma acirrava; tudo em nome de uma pessoa.

Durante um bom tempo não ficou claro para mim que nada de competição havia entre nós. Primeiro, porque eu não queria ver a inexistência do objeto, do objetivo pelo qual competir. Segundo, o que havia era uma co-existência, uma atuação na qual eu tinha minhas participações especiais.

Neste momento sei que você, meu “competidor”, está muito enfermo. E não por piedade mas por humildade admito minha derrota e minha inveja.

Mesmo na sua doença, você teve aquilo (na verdade, alguém) que eu não tive mesmo com toda minha saúde.

Se na minha cama ela, a razão da nossa “disputa”, perdia algumas horas, era na sua que adormecia. Se em meus braços tive alguns suspiros, era nos seus que perdia o fôlego. Se ao meu lado tinha alguns momentos, era contigo que tinha uma vida.

Enquanto eu curtia a intensidade do agora, você administrava a rotina dos anos. Enquanto eu me perdia nas possibilidades de um futuro, você se encontrava no presente. Enquanto eu era “e se”, você “já é”.

A nossa diferença é que eu acho que não tive pouco e você tem certeza de que teve muito.

Mas, caro “competidor”, ignoramos um fato interessante: nós somos cúmplices, parceiros de uma grande ironia. Nossa tentativa de ter alguém nos provou que ninguém é passível de posse.

Talvez você nunca leia essas palavras que lhe dedico, talvez nunca saiba da minha existência. Mesmo assim estou torcendo pela sua plena recuperação e, principalmente, pela sua felicidade, seja ela como (e com quem) for.

sábado, 19 de junho de 2010

"You Can't Always Get What You Want"

Há tempos a música abaixo estava martelando na minha cabeça; quase uma obsessão. Esse é o principal critério que uso para saber o que devo ou não baixar no meu iPod.

Hoje esse clásssico integrou a minha mp3teca e,coincidência ou não, ele resumiu alguns fato do dia.


sábado, 12 de junho de 2010

Para crer no hoje

Breves histórias (reais ou fictícias?) que às vezes me fazem crer que o Dia dos Namorados pode ser mais do que uma data comercial:

Num apartamento na tarde fria de Sábado:
- Amigo, vou deixar o apartamento. O Jone me convidou para morarmos juntos.

Ela pára com seu barrigão no corredor lotado do supermercado e diz:
- Amor, ponha a mão aqui, rápido. O Luquinha está se mexendo.

Um casal de idosos num Celta branco acha uma vaga na rua. Ele, no banco de passageiros diz à esposa ao volante:
- Espera aí Marieta, eu vou descer para ajudá-la a estacionar o carro.

O garçom aguarda a saída dos últimos clientes que estavam almoçando, até que um deles lhe pergunta:
- E aí, ansioso para assistir o jogo da Copa que vai começar?
- Não senhor, estou com pressa de ir pra casa. Prometi à patroa que ia levá-la hoje ao forró.

Enquanto a veterinária medicava a cadela que estava tendo sérios problemas no baço, Laura olhou chorosa para Andrea que previu o diálogo e respondeu rapidamente:
- Xiiii, não se desculpe, Lau. A gente tem todos os outros dias das namoradas, OK?

Ele olha para o namorado que hoje está tão diferente de quando se conheceram e pensa:
- Que ódio desse tumor que deixou você careca, fraco e inchado! Mesmo com as minhas e as suas mancadas, não imagino mais ninguém, além de você, do meu lado hoje.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Cadê?

E aí cara, cadê?
Cadê a crença de que hoje é melhor que ontem e amanhã melhor que hoje?
Cadê o ímpeto da evolução do corpo, da revolução da mente e da isenção da alma?
Cadê o brilho nos olhos pelas gentilezas gratuitas?
Cadê a certeza de que as incertezas fazem do mundo um lugar mais interessante?
Cadê o tesão pelo novo e a redenção pelo velho?
Cadê a ironia como instrumento da diversão?
Cadê a palavra como instrumento das suas verdades?
Cadê o arrepio pela música do “caralho”, pelo filme “de foder”?
Cadê os devaneios tolos em nome dos sonhos concretizados?
Cadê a inocência lapidada e a maturidade ainda bruta?
Cadê o sorriso sem máscaras?
Cadê o suspiro sem fôlego?
Cadê a lágrima solta?
Cadê o sangue oxigenado?
Milton, cadê você?

sábado, 1 de maio de 2010

Uma amizade, um muro e vários tijolos

Um muro está se edificando entre nós. A cada dia consigo ver e sentir os tijolos que estamos investindo nesta obra.

Você contribui com as respostas mal educadas, as alfinetadas gratuitas, a distorção entre proteção e pena, a revolta mal administrada e a falta de vontade de ouvir. E o muro cresce.

Eu entro com o revide, o achar que é pessoal, a incompreensão, a impaciência e até uma certa imaturidade em lidar com esse tipo de crise. Mais tijolos.

A construção já faz o quarteirão que nos separa parecer um bairro. E o que fazemos? Só contribuímos com mais tijolos. Virou competição.

Esta obra está repleta de sentimentos e atitudes mal interpretados. Já quase não conseguimos reconhecer o alicerce disto tudo: o amor e a amizade.

Se não sentarmos o quanto antes para reavaliar os contorno deste muro, o tempo poderá transformar em concreto as nossas diferenças e ficará mais difícil reconstruir aquilo que um dia chamamos de amizade.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Segredos além dos olhos

Tento não me deixar levar por premiações como o Oscar; nem sempre o mérito delas reflete a qualidade das obras e sim as cifras arrecadadas. Mas hoje eu me rendi ao ganhador do melhor filme estrangeiro de 2009: O Segredo dos Seus Olhos (El Secreto de Sus Ojos, 2009 – Argentina e Espanha)

Você pode classificar a película como bem quiser: thriller, romance, policial ou drama. Eu decidi inventar a categoria “duas histórias de amor alinhavadas genialmente por um clima polícia-bandido com pequenas doses de suspense.” O que só prova que estou bem longe de ser um crítico de cinema. Melhor assim.

Com roteiro baseado no livro "La pregunta de sus ojos" do argentino Eduardo Sacheri e dirigido por seu conterrâneo Juan José Campanella, O Segredo dos Seus Olhos é uma produção que capricha na reconstituição de época, traz uma fotografia de encher os olhos e até cenas com edições mais conteporâneas. E, é claro, uma história que merece um capítulo a parte.

Na minha opinião, o grande trunfo do filme é ser essencialmente um romance disfarçado de forma intencional de policial e suspense. Sem falar no desfecho que aceita muito bem o previsível e o inesperado.

Aí você de se dá conta de que muito pouco separa o temor do amar.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

"Soldier of Love"

Sade é uma herança dos tempos em que eu nem sabia o que era boa música, mas a reconhecia instintivamente.

Ainda lembro do encanto quando vi (e ouvi) pela primeira vez, lá nos idos de 1980, o clipe "Smooth Operator" com aquela nigeriana radicada em Londres de estilo único (longa trança ressaltando a grande testa e batom vermelho berrante - este último detalhe só soube tempos depois, pois minha TV ainda era P&B), a voz aveludada e uma sonoridade que flertava com o cool e o caberet.


De lá pra cá foram 7 álbuns e uma obsessão incondicional por essa mulher que traduz fielmente em canções as delícias e os desabores da paixão, do amor. Talvez parte da minha crença romântica ainda permaneça por causa dela.




segunda-feira, 29 de março de 2010

Um sonho bate na porta

A TV já não tinha a minha atenção. A hora a menos de sono se fez ali credora; dormi no sofá. O pescoço mal acomodado e o corpo encolhido não impediram o cansaço.

A campainha toca. O susto acontece. Apaguei por horas que passaram como minutos ou minutos que pareceram uma eternidade? Não sei. Só sei que ainda chovia.

Então me dou conta de que o interfone não tocou. Quem seria? Não interessa, eu não estava em condições e trajes para receber ninguém.

Repito: mas o interfone não tocou. Me aproximo da porta.

- Quem é?

- Eu vim devolver o guarda-chuva que o senhor me emprestou.

A voz não tinha nada de familiar. Mas era suave. Vou até a cozinha e não há nenhum guarda-chuva faltando – quem anda a pé sabe que é bom ter mais de um.

Volto à porta. Parei diante dela e tentei me dar conta do que se passava. Não há tempo; ainda tem alguém do outro a espera.

Movido mais pela curiosidade do que pela coragem, entreabro a porta. Com ar perdido fito uma expressão ressabiada, quase assustada; talvez constrangida.

Era um belo rosto de traços marcantes. A pele naturalmente morena - aposto que é macia -, os cabelos ligeiramente encaracolados. Olhos castanhos escuros, quase negros; carentes.

- Eu vim devolver o guarda-chuva que um senhor me emprestou na entrada do prédio. Ele pediu que eu o entregasse no apartamento 123.

Minha paralisia já não era mais de susto. Era encanto!

- Putz, acho que houve um engano – respondi de imediato mas tentando ser acolhedor.

A cor morena não permitia vê-lo, mas tenho certeza de que ali havia um rubor. Só aumentou a minha empatia. A simpatia também.

- Acho que entendi o número errado do apartamento. Vou deixar o guarda-chuva na portaria. Desculpe-me

- Não tem problema.

Antes de fechar a porta, pensei num galanteio, num convite, num recurso para prolongar o momento.

E ali entendi que qualquer tentativa de dar propósito ao acaso roubaria a beleza daquele instante.

Fechei a porta. Sorri discretamente. Não quis entender o que se passou. Queria mesmo ter a certeza de ter sonhado acordado.

terça-feira, 23 de março de 2010

"Sugar Water"

Esse é só um dos motivos pelo qual sou louco pelo genial cineasta francês Michel Gondry. O vídeo a seguir foi lançado em 1996 e é de uma banda nova-iorquina chamada Cibo Matto formada por duas japonesas.


Cibo Matto- Sugar Water

domingo, 21 de março de 2010

Recomeçar

Recomeçar significa “eu já fiz isso”, “eu ainda estou tentando”.
Recomeçar me dá a chance de fazer as mesmas coisas de um jeito diferente.
Recomeçar me deixa em estado de alerta, a flor da pele
Recomeçar às vezes grita pra mim “eu fiz merda antes”.
Recomeçar serve como alento pois alguém disse que é inerente do ser humano.
Recomeçar me faz sentir iniciante de novo.
Recomeçar é ser estagiário com status de sênior.
Recomeçar sussurra pra mim “eu não perdi a esperança”
Recomeçar é rebobinar um filme para mudar o final.
Recomeçar depende dos pontos.
Recomeçar depende do ponto de vista.
Recomeçar depende do ponto de partida.
Recomeçar depende do ponto final.
Para os sábios, recomeçar é apenas um novo começo.

terça-feira, 16 de março de 2010

O silêncio das palavras

Diante daquelas breves palavras eu perdi as minhas. Até um minuto atrás eu tinha todo um discurso preparado. Agora nem balbucio coisas sem sentido.

Um texto direto, certeiro e até gélido, quase impessoal. Tão exato que não dá margem para erros. É um convite.

O que parecia improvável se materializou em palavras. O meu improviso nem ensaiou qualquer esboço. Ficou só no rabisco.

Pergunta simples. Resposta simples. Sim ou não. Complexos mesmo são os significados e os significantes do interlocutor. Semiótica? Semivisão.

Eu quero sem parecer querer demais disfarçando com ar de quem quer de menos. Menos para mais ou demais para menos?

Toda a maturidade de uma vida prática versus o exagero das cores vibrantes de dramas inexperientes.

E diante daquelas breves palavras... eu continuo em silêncio.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Curtos pensamentos curtos

Ana saiu do cinema e, enquanto comia o resto da pipoca que sobrou no fundo do saco, consolou a si mesma:

- Comédia romântica é tudo que você precisa na sua vida amorosa. A realidade é complicada demais.


O açougueiro colocou o embrulho com os dois quilos de fraldinha de sobre o balcão e perguntou à Clarice se ela queria algo mais. A cliente pensou:

- Quinhentos gramas de paz mundial, por favor.

O hiato durou alguns segundos e ela respondeu:

- Meu marido está viajando. Não se atrase de novo, ouviu?


Maurício prestou atenção na moça sentada num dos bancos do aeroporto. Ela aparentava uns trinta e poucos anos, estava bem vestida e tinha uma beleza “quase convincente”. De cada 30 segundos que perdia lendo o livro que tinha em suas mãos, ela passava os outros dois minutos observando quem passava.

- Essa moça veio de longe para se encontrar com um cara que conheceu pela internet. Ela se deu conta de que ele era louco. Houve uma discussão entre os dois. Sem dúvida eles brigaram. Ele a largou no hotel. Ela ficou sozinha numa cidade desconhecida e está buscando amparo no primeiro estranho que lhe der atenção.


A garota sem identidade aproveitou o sinal vermelho para limpar o para-brisa do carro vermelho com a moça bonita no volante. Tudo em troca de algum trocado. A moça bonita fechou o vidro, fechou os olhos e acenou uma negativa.

- Se preocupa não moça, quando o sinal abrir eu vou fingir que sou uma você melhorada. – resmungou a garota sem identidade.